16 de novembro de 2008

O meu amor bateu com a cabeça numa rocha.


O meu amor bateu com a cabeça numa rocha.

Era um amor de Rita, um desses amores grandes no momento, mas que se abatem com o passar das horas. Era, por aqueles dias, o seu amor, contudo. Numa rocha, talvez fosse metafórico. Paulo, astuto, perguntou: Então, o que se passou?

O meu amor bateu com a cabeça numa rocha. Rita repetiu a frase.

Paulo, silencioso, intimidou-a, forçando-a a desfazer-se em mais palavras.

Perdi-o e prefiro-o (saber) morto.

(Paula Rego, o fim da história)

7 de novembro de 2008


Olhou para aquela ruga como se fora a única marca no seu rosto.
Até àquele momento, Ana havia desafiado o tempo e se dito velha, mas agora havia marcas que não necessitavam da sua voz para serem percebidas.

Uma ruga, que não desaparecia com o desfazer da expressão, mas que permanecia, teimosa, como todo aquele corpo, a insistir para que se prendesse a um mundo de relógios e calendários, aos quais não poderia mais ser indiferente.

Chegaria o dia, onde lhes perderia a conta, mas aquela seria sempre a primeira, num tempo que passa e deixa marcas.

1 de novembro de 2008


Agitou-se como nunca num corpo tão só seu ao som da música de sempre, que ela própria entoava.

Olhares perdidos encontraram-na e, mais perdidos, soltaram risos.


Rio-me eu mais, porque sei por que danço!


Indiferente, ou pelo menos com uma aparente indiferença, Filipa, autónoma e inexorável, permaneceu, em múltiplos movimentos num ritmo único que lhe pertencia.

Terminada a música, porque até estas têm um fim, caminhou segura até ao extremo da porta, onde a esperava a vida de sempre atrás de um avental.


(Louise Bourgeois)