25 de agosto de 2005

Uns Sublinhados

Sossegada a conversa, deixo ainda uns sublinhados.
helder filipe

Alegria Breve
Vergílio Ferreira

Como uma árvore, às vezes, penso o homem pode subir alto, mas as raizes não sobem. Estão na terra para sempre, junto da infância e dos mortos.

Possivelmente eu gostava ainda de me baloiçar_ mas quem podia perdoar-me a infância?

Assenta os pés no chão, um dia hão-de perguntar:
_ Que fizeste da esperança?

Deus dorme, enfim, André. E fá era tempo. Já era tempo de cuidarmos de nós. Ah, a infância acabou, e as fraldas mudadas e o darem-nos comer pela mão. Sol claro com ferro em brasa.

Dedos grossos, a pele engelhada- estás velho? (…) Onde se vê a nossa idade? Estás velho- como? Estou jovem como sempre, porque sou eterno. Só os outros não o sabem, mas que é que sabem os outros? (…)(tenho de comprar um espelho- há ainda um espectador que sou eu.)

Os mortos lembram-me.

A presença de mortos em todo o lado: sapatos da minha irmã, um velho xaile da minha mãe., até a coleira da Lira (…) Destruir tudo? Têm vozes inoportunas.

Estou só, terrivelmente povoado de mim.

E depois? E DEPOIS? Após todos os combates e raivas e esperanças, pergunta sempre «e depois?». Atinge o teu limite, suor, sangue na caminhada, o suor e sangue que te diz a importância do caminhar, e quando chegares ao fim, pergunta ainda «e depois?». Pergunta na humildade ou aos gritos, em despero. Mas pergunta sempre.

Saudade de outrora, que é a saudade da infância? É a saudade de mais longe, o apelo do nunca.

Alguém passou por mim e me roubou, a minha pobreza tem o olhar rendido de um cão.

Ora a velhice tem também o seu interesse. Um corpo velho é tão misterioso. Por exemplo, o que envelhece mais é sempre o que está mais à mostra. Quanto mais à mostra, mais a idade. É, por isso, que por dentro não tenho idade (...)

Não um choro pelo que se me perdeu, mas apenas um choro por mim. Como as crianças quando já esqueceram as razões e choram ainda.

Qualquer coisa perdi há muito tempo e já não me lembro.

1 de agosto de 2005

Mais uma brasa!

Mas que agradável discussão;)
Este fim-de-semana, já licenciado, fui a casa e apercebi-me bem de quão próximo me encontro de mais uma fase deste doloroso processo de crescimento.
As paredes do quarto não facilitaram, provocando-me incessamente, com perguntas mil, sobre o futuro. Projectaram-me para daqui a uns vinte anos, o que estarei a fazer e que significado terão aquelas paredes que me prendem ao que sei ter de deixar! E o que será de quem as habita? Quantas rugas marcarão o resto do caminho que já não é meu... Quantas? Quantas que não vou ver. Restarão as minhas...
A propósito deixo aqui um poema, que confesso o meu preferido de Eugénio de Andrade e que me motivou a este tema!
Um abraço! No regresso de férias, voltarei aqui. Espero que até lá o sete já anda por estas coisas da net!
helder

Poema à Mãe

No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe!
Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
ao fundo dos teus olhos!
Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais!
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura!
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos...
Mas tu esqueceste muita coisa!
Esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Olha - queres ouvir-me? -,
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal...
Mas - tu sabes! - a noite é enorme
e todo o meu corpo cresceu...Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber,
Não me esquecerei de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas...
Boa noite. Eu vou com as aves!

crescer ainda

Crescer ainda é preciso, sendo certo ser perda continuada... Lá diria o grande hf, crescer é desconstruir-se! bolas, que me tira pensamentos! Ando eu ocupado com isso. Com criar espacos, sobretudo meus. Com refazer o que pensava feito. A desconstrucao é mais penosa que a construcao, digo eu... A construcao é quase sempre numa direccao e com um objectivo determinado (ainda que mude a meio caminho, vezes sem conta!). A desconstrucao é anárquica e aparentemente sem sentido. É nao saber para onde nos leva a estrada e estar feliz com essa opcao! ah, crescer doi!
s.chacim ;(