21 de abril de 2014

            Lembro-me de um tempo em que o sol se escondia com um sorriso, para dar lugar à lua que bailava cheia de promessas e ao sono que vinha sem se pensar. Quando o sol regressava, fazia-o com o mesmo sorriso com que partira e despertava para uma vida em que não se perguntava a razão do acordar.  Os dias eram dias, mas sempre superados por sonhos garantidos num futuro desenhado a caneta permanente.
           


Lembro-me de acordar nesse futuro...


Agora,
há o aceitar,

e há o adiar.


11 de fevereiro de 2014

A noite ouviu suspiros
e corações apressados.

Viu abraços e beijos,
corpos entrelaçados.

Mas, sentiu-se lograda:
um coração batia por tudo,
o outro batia por nada.



11 de outubro de 2013

Não há mais histórias como aquela

Não há mais histórias como aquela porque as regras das probabilidades que jogam com a vida ainda não encontraram mais nenhuma porta a quem tal acontecimento possa bater.

Faltam os atores.

Falta o cenário.

E falta sobretudo uma personagem como a Rita, que se apresse a abrir a porta perante um bater tão ligeiro:


Corre, Rita! 
Corre, Rita! 
A porta! 
A porta! 


Não falta quem bata assim. São maneiras que se aprendem e que se enraízam nuns quantos, porque dão resultado. Mas o mundo também aprende a desconfiar.  Bateres assim só são bem sucedidos por tempo muito curto, passando ser vistos como uma pedinchice, altura em que terão de encontrar outros ouvidos.  Feitas as contas das probabilidades, haverá sempre quem caia nesses bateres mas nunca haverá quem caia como Rita caiu.



Rita caiu.

Com a queda

Levou sonhos
e tudo o que a suportava.

 
Foi tão grande o estrondo que o sorriso que se apressa a acrescentar neste embaraços foi ineficaz.

Estatelada.
Caída.
Derrotada.

...

Mas, o raro ainda se tornou mais raro. Os sonhos não se desfizeram com a queda e numa elasticidade, que o tempo faz agora ver como fantástica, saltaram para onde vieram e uniram-se a Rita, na sua quase imediata ortogonalidade.






8 de maio de 2013

Para um ensaio sobre o esquecimento

Na história dos tempos, há histórias que ficarão sempre por contar. Dirão os sábios e os bem-resolvidos: disto é a feita a vida. É, nessa vida, que, competindo com os acontecimentos do presente e a imaginação do futuro, se agitam e reconstroem as memórias das histórias. É, nessa vida que se ri e que se chora com o recordar, que se regozija e que se arrepende, que se contam e recontam as histórias do que já foi. Quando se dá o último suspiro, leva-se consigo tudo ou quase tudo e deixando apenas "o que fica".

Ficarão os registos de palavras, de imagens e de sons gravados nos memórias dos estão vivos e gravados porventura num qualquer suporte físico, se essa sorte lhes aprouver.  Ficarão as pessoas, que podem ou não consultar esses registos e reavivar as histórias.


De uma vida de memórias, pode ficar pouco ou quase nada. Há velhos que morrerão no alto da serra sem deixaram um único registo, ou uma alma que se lembre deles. Mas, pode ficar mais, muito mais, como ficou de tantos que nos enchem a história. E, à medida que se avança no mundos dos gigas e dos terras na palma da mão, ficarão ainda muitos mais registos, muitos mais, de tal modo que podem  ultrapassar o limite de armazenamento da memória humana.


Mas a vida das histórias está na vida. Os registos só regressarão a uma qualquer forma de vida, quando encontrarem corpos sequiosos por saberem as histórias que aqueles registos albergam. Há caixinhas de lata com umas quantas fotografias que nunca vislumbrarão a luz de nenhum olhos. Há diários que nunca serão abertos, que morrerão com o expirar do papel. Há gigas e bytes que se vão dissipar até serem eliminados pelo tempo ou por um servidor. Há livros que vão ser guardados e abertos só passados muitos anos, num tempo em que já ninguém sabe quem foi o autor. Nem todos poderão ter a alegria de marcar a história do seu tempo, e mover homens e mulheres em busca de uma página da nossa história muito depois da sua morte. No entanto, alguns, mesmo que não marcando a história, podem deixar quem os fará viver depois da sua morte. Talvez isso seja mais certo no caso de descendentes, para quem os tenha, mas haverá também amigos, conhecidos e outros que se lembrarão de alguma parte dos que já se foram.

Ora dito isto, o que fazer de tudo o que se vai com este esquecimento? Talvez seja aqui que começa o tal viver no momento.

31 de março de 2013

lágrimas II

Desceu,
despreocupada,
a lágrima,
coitada.

Rompeu por um sulco
e encontrou jeito de cair,
redonda,
só,
esmagada
numa pedaço de chão
que enchia o nada.


Os olhos,
que a viram parir,
fixaram-na e
perceberam lamentos
ainda por contar...


Outros olhos,
que não lhe sabiam a dor,
viram o molhado do chão:
Faz chuva em pleno verão?

lágrimas I

Ui!

Uma lágrima que se desprendeu.

Apressem-se!
Apressem-se, mãos
e desfaçam a coitada!
Que ainda não se saiba
do que padeço eu.

Histórias

Sei de histórias lindas,
lindas de morrer.
Li-as,
ouvi-as,
vi-as
e algumas até as escrevi.

Saltam-me ao pensamento,
umas quantas,
mas vêm tão depressa
tão depressa
que a caneta atrapalhada
nem tem tempo
para as prender...
E logo vêm outras
que adormecem as primeiras.


Ah, se tas contasse...
Se tas contasse,
gostava de ouvir um "Ah!"
um "Oh!"
risos!
lágrimas!
e sorrisos, muitos.


Se tas contasse,
seriam nossas e
não apenas minhas.

Mas não tas conto,
nem tas digo antes do tempo.
Não vás tu não ter ouvido
E eu ficar sem alimento.

8 de julho de 2012

para uma quadra




8 de maio de 2012

E, quando menos esperava,
acordei e senti-me quase morta.

Morta.

Morta nos dias que se somaram em anos,
nos anos que desfizeram os dias.

Acordar assim arremessa-nos para o vazio de uma sujidade imensa,
em que os relógios nos atormentam e os calendários marcam fins de histórias não começadas,
em que o grito se sente sem eco,
em que nada vale a pena.

Mas,
depois vieram outros acordares,
e até um pulsar tão forte que me fez sentir ter coração.

Quando finalmente morri,
deixei de sentir.
A sujidade,
essa ficou sempre a mesma.

15 de janeiro de 2012

Numa noite dessas,
nada se diz,
porque se percebe a inutilidade de todas as palavras.

Numa noite dessas,
ainda se chora,
porque o coração se sente desfeito e há rituais a cumprir.

Numa noite dessas,
o escuro é mais escuro do que a ausência do sol.

Numa noite dessas,
a memória esquece-se e
arrasta-se o sofrimento até à eternidade.


Paulo, sem piedade, fez Rita saber que estava tudo terminado entre eles. Por mais que tivesse antevisto o fim daquela relação, ela via este final como súbito. dramático e desnecessário, como são todos os finais para aqueles que se prendem ao amor.

11 de agosto de 2011


18 de julho de 2011

Que se conte a história, mas que se diga tudo. Tudo o que há para dizer, que não funciona assim e que é preciso mudar!
E que é preciso mudar e que o tempo é pouco para se sentir cada mudança, mas é longo o suficiente para mudarmos.

Que se conte a história e que se diga que somos muitos e que poucos se sentem como tantos.

Que se conte a história, e que uns adormeçam, mas que tu e eu continuemos acordados ao som deste bater.

28 de maio de 2011

"Esqueci-me de te dizer que ias sofrer, Rita. Esqueci-me. Se te o disse, nunca o fiz assim. "
Era esta a parte preferida da carta que a sua mãe lhe escrevera há anos atrás. Volta meia, Rita li-a. Não que nao soubesse estas palavras de cor. Sabia-as tão bem, do mesmo modo que se lembrava do dia em que a recebeu, do seu espanto ao ver a mãe entregar-lhe aquele envelope branco e do susto que teve ao pensar que a mãe estaria perto da morte.
"Não que vá morrer em breve, Rita, mas bem sei que um dia as minhas palavras vão deixar de pesar em ti do modo que ainda pesam. Serei pequena, uma personagem apenas na tua vida grande. Deixa-me aproveitar a grandeza que ainda tenho em ti e falar-te do que eu penso." E assim começara uma série de cartas que a mãe lhe enviou ao longo de oito semanas.

"Esqueci-me de te falar que viver dói, e dói tanto por vezes. E se todos conhecemos sofrimentos, só tu saberás dos teus. O meu amor será pouco útil, ou mesmo inútil, a apagar a tua dor. As palavras serão fracas quando o teu coração se partir. Verás pouco, muito pouco do futuro. Estarás imersa num presente imediato até acordares um dia e perceberes que já não dói mais." E mais abaixo, "Rita, acredita em ti e na força que encontras nos dias que passam."

26 de maio de 2011


Desistir era a palavra do momento. Em campos que foram outrora de batalha, pedia-se agora que o mais valente ato fosse o de retirada. Recolher armas, desistir de sonhos e de mudanças súbitas e contrárias ao passado, e avançar noutro sentido. Deixar tudo o que não foi e nem podia ser nosso, ultrapassar a frustração de nunca ter ouvido as palavras que sabiamos de cor, e enfrentar outras lutas, bem mais nossas.

16 de maio de 2011




Somos filhos da madrugada e da noite mal dormida. Cantamos canções que nos escutam e que rimam com o nossos olhos. O amor perdeu-nos e vivemo-lo na vida dos outros. Rimo-nos com gargalhadas soltas das partidas que nos pregam(os). Lemos o espelho e conhecemos as mudanças, mas acreditamos que, numa vida longa, tudo se há de encontrar.

5 de maio de 2011



Era apenas uma vida: a sua.
Era apenas uma perspectiva: a sua.
Era ela que se dedicava horas a fio a olhar para a sua vida, um caleidoscópio agitado nas suas mãos na incessante procura.

4 de maio de 2011

22 de abril de 2011


Rita não amava, nem esperanças tinha de ser amada. Eram os gestos e as palavras que lhe faziam falta, como se estes valessem mais do que a realidade, como se o seu coração estivesse pronto para amar.

Fazes-me falta, disse ela por fim.

23 de março de 2011


Sou de um tempo em que as palavras não doíam,
em que os homens caminhavam sem saudade,
em que se crescia só por querer.
em que viver não se pensava, só se fazia.

Sou de um tempo em que o tempo não doía.